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A professora de Medicina e diretora de Pesquisa Cardiovascular Intervencionista e Ensaios Clínicos do Mount Sinai School of Medicine, em Nova York, Roxana Mehran, participará da conferência de abertura do 45º Congresso da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo. Direto dos Estados Unidos, ela concedeu uma entrevista para a SOCESP.
SOCESP: Atualmente existem muitos medicamentos para o controle de fatores de risco e conhecimento a prevenção (alimentação saudável e exercícios físicos). O que falta ainda para diminuirmos as mortes por doenças cardiovasculares no mundo?
Roxana Mehran: Embora existam medicamentos novos e extremamente importantes que impactaram positivamente os desfechos cardiovasculares, ainda estamos atrasados em alcançar nossos objetivos de controle dos principais fatores de risco e de garantir o acesso a medicamentos para todas as pessoas. Nossos objetivos no controle da pressão arterial, cessação do tabagismo (um enorme problema entre mulheres jovens), manejo dos lipídios, controle do diabetes/glicose, gerenciamento do peso, exercícios, cuidados com a saúde mental, não foram totalmente atingidos e continuam aquém do ideal. Precisamos alcançar todas as comunidades se quisermos impactar a globalmente as doenças cardiovasculares.
SOCESP: Você é uma liderança em relação à conscientização das doenças cardiovasculares entre as mulheres. A mulher ainda negligência os cuidados com o coração? Por quê?
Roxana Mehran: Nas últimas quatro décadas, tivemos um impacto significativo na redução das mortes cardiovasculares em homens e mulheres. No entanto, na última década, a trajetória das mortes por doenças cardiovasculares seguiu na direção contrária, mostrando um aumento de 2010 até agora! Isso é especialmente evidente entre mulheres jovens e em todas as mulheres em geral. Enquanto isso, a conscientização de que as doenças cardiovasculares são a principal causa de morte entre as mulheres diminuiu. Devemos unir forças e continuar educando tanto o público quanto a comunidade médica sobre essa estatística crucial. Isso é essencial. O momento de agir é agora!
SOCESP: Segundo o Posicionamento sobre Doença Isquêmica do Coração do Brasil, de 2023, os infartos aumentaram 23,2% e principalmente entre mulheres jovens (de 15 a 49 anos). Você tem percebido a mesma tendência nos EUA e no mundo? E por que as mulheres estão morrendo mais do coração?
Roxana Mehran: Isso, de fato, é verdade. Estamos observando essa tendência em todo o mundo, inclusive nos EUA e no Canadá! Existem várias razões, incluindo melhores ferramentas de diagnóstico (como o HS TPN) e uma mudança nos padrões de tabagismo: os homens estão fumando menos, enquanto as mulheres (especialmente as muito jovens) estão fumando e vaporizando mais. Há muitas outras razões, e precisamos abordar cada uma delas com iniciativas claras.
SOCESP: No Brasil, as mortes por infartos ainda liberam as doenças cardiovasculares entre os homens. Já para as mulheres o AVC segue em primeiro lugar. Qual hipótese você traçaria para essa diferença entre gêneros?
Roxana Mehran: Temos pouco conhecimento sobre os mecanismos e a biologia do AVC em mulheres, pois elas têm sido historicamente sub-representadas em ensaios clínicos. Além disso, os estudos pré-clínicos com medicamentos e dispositivos costumam ser feitos apenas em animais machos. Precisamos considerar o sexo como uma variável biológica, indo além dos hormônios sexuais, e entender seu impacto na biologia das doenças. Não me surpreende ver essa diferença nos dados. Vale lembrar que há uma grande relutância em prescrever anticoagulantes para mulheres por medo de sangramentos, além de um subdiagnóstico da fibrilação atrial em mulheres, entre muitos outros fatores.
SOCESP: As Femtech, soluções tecnológicas para as mulheres, têm se proliferado no mercado. Como você vê a tecnologia auxiliando no cuidado cardiovascular das mulheres? E quais os riscos que a tecnologia oferece?
Roxana Mehran: Essa é uma iniciativa extremamente importante, e precisamos envolver essa comunidade. De maneira geral, o setor de tecnologia entende o papel fundamental das mulheres na saúde. As mulheres são as principais consumidoras de cuidados de saúde dentro das famílias e impulsionam novas tecnologias. O pensamento inovador feminino na área de tecnologia tem sido amplamente reconhecido, refletido no slogan: “Conquiste as mulheres, conquiste o mercado”. Acredito plenamente que devemos trabalhar de forma colaborativa com as FemTech para aprimorar nosso conhecimento e integrar sua expertise na redução das doenças cardiovasculares para toda a humanidade.
SOCESP: Para você qual é a importância do Congresso da SOCESP e qual a importância desses debates científicos para a população?
Roxana Mehran: Sou uma participante fiel do Congresso SOCESP há duas décadas. O Congresso SOCESP desempenha um papel central ao reunir especialistas de todo o mundo para compartilhar conhecimento e experiência em uma abordagem multidisciplinar para melhorar a saúde cardiovascular globalmente. Além disso, é um evento onde importantes conexões profissionais resultam em colaborações significativas, levando a estudos, pesquisas e avanços clínicos inovadores. Sinto-me honrada por fazer parte desse evento e estou ansiosa para um encontro muito produtivo com meus queridos colegas.
O professor associado de Medicina da Universidade de Pittsburgh, na Pensilvânia, Marcio Sommer Bittencourt, participará pelo segundo ano consecutivo do 45º Congresso da SOCESP, que ocorrerá nos dias 19, 20 e 21 de junho, no Transamérica Expo Center, em São Paulo/SP. Diretamente dos EUA, ele concedeu uma entrevista exclusiva, na qual comentou que o congresso “é o maior evento científico da cardiologia brasileira atualmente. As oportunidades de atualização e de networking com os colegas o tornam único”.
Marcio Bittencourt irá proferir duas palestras. A primeira tratará da "Inteligência Artificial em Imagem Cardiovascular - Tomografia". Ele lembrou que, embora o tema da IA tenha ganhado mais destaque nos últimos dois a três anos, os diferentes modelos de automação em imagem cardiovascular vêm sendo desenvolvidos há muito tempo. “Na área de tomografia cardíaca, os modelos têm, na minha visão, dois enfoques principais. Primeiro, a tentativa de automatizar e acelerar o processo de análise das imagens. Neste grupo de tecnologias, temos softwares cujo objetivo é agilizar o processo atual de elaboração do laudo. O segundo grupo de aplicações está relacionado a modelos que buscam detectar informações que não são acessíveis na análise habitual dos exames de tomografia. A IA tenta extrair novas informações que possam melhorar nossa capacidade diagnóstica e de avaliação prognóstica em cardiologia”, contextualizou.
A outra palestra do professor da Universidade de Pittsburgh será “Compreendendo a Placa Vulnerável: A Imagem Pode Fazer Realmente a Diferença? – Caracterização da Placa Vulnerável por Tomografia Computadorizada”. Segundo Marcio Bittencourt, a avaliação de placas ateroscleróticas é um dos principais usos da tomografia cardíaca e, além da detecção da presença das placas e do grau de redução luminal, esse exame permite a quantificação da extensão das placas, bem como a caracterização de sua composição, derivada da atenuação das imagens. “Nesta apresentação, pretendo discutir os estudos que avaliaram aspectos das placas que podem estar associados a maior risco de ruptura”, explicou.
Questionado sobre a importância de o paciente aderir aos tratamentos e estar bem informado, o professor ressaltou que o envolvimento é parte essencial do cuidado de qualquer doença crônica. “Para garantir a aderência a longo prazo, é necessária uma abordagem multilateral que envolva o acesso do paciente à rede de saúde, a redução do custo do cuidado, o acesso à informação de qualidade e medidas de reforço e incentivo ao paciente. São intervenções, por vezes, complexas, que necessitam de estrutura adequada para serem implementadas”, concluiu.
O professor de Medicina da Queen’s University, no Canadá, editor-chefe do Journal of Electrocardiology e presidente da Sociedade Interamericana de Cardiologia (Interamerican Society of Cardiology - IASC), Adrian Baranchuck, estará no Brasil em junho, especialmente para participar do 45º Congresso da SOCESP – Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo, nos dias 19, 20 e 21 de junho, no Transamerica Expo Center.
Direto de Kingston, no Canadá, onde fica a Queen’s University, o professor falou sobre as duas palestras que irá proferir no evento. “A Fenocópia de Brugada (tema da primeira apresentação) continua sendo um desafio clínico. Principalmente, a decisão de determinar que um paciente com padrão de eletrocardiograma (ECG) de Brugada não tem a Síndrome de Brugada tem sérias implicações clínicas. Pacientes com fenocópia de Brugada não necessitam de CDI (cardiodesfibrilador implantável) ou tratamento antiarrítmico, mas sim tratamento da condição subjacente. Vou revisar todas as estratégias para se chegar ao diagnóstico adequado e mostrar diferentes experiências ao redor do mundo sobre como cuidar desses pacientes”, explicou Adrian Baranchuck.
O outro tema que o professor irá tratar será focado na atualização do diagnóstico e tratamento da Fibrilação Atrial – Síndrome de Bayés e como prever usando o ECG. “A Síndrome de Bayés refere-se à presença de bloqueio interatrial (no ECG de superfície) e a um histórico de fibrilação atrial paroxística. Identificar essa alteração no ECG antes de o paciente desenvolver fibrilação atrial pode ajudar a definir estratégias de acompanhamento e a decidir sobre o uso de anticoagulantes orais para prevenir o AVC. Podemos prever o risco de fibrilação atrial incorporando o ECG de superfície a um modelo de predição. Vamos discutir como diagnosticar e manejar essa condição”, completou o presidente da IASC.
Perguntado sobre a adesão aos tratamentos pelos pacientes, Adrian Baranchuck destacou que esse é sempre um grande desafio. “Hoje, os médicos precisam enfrentar informações diversificadas, às vezes completamente incorretas, que são facilmente encontradas nas redes sociais. Alguns pacientes chegam à consulta com uma ideia já formada de como sua condição deve ser tratada, e nosso papel é fazer o melhor possível para oferecer fontes de informação baseadas em evidências, para que eles compreendam o raciocínio por trás do manejo e do tratamento. Isso exige tempo, paciência, e meu melhor conselho é: ouça o seu paciente. Apenas ouça. Assim, você entenderá o que ele precisa para melhorar a adesão e ter confiança no tratamento proposto. Não imponha sua visão, mas seja firme ao determinar o que é melhor em cada caso. Um acompanhamento mais próximo é desejável, embora muitas vezes muito difícil de implementar por razões sociais e econômicas. Persista em recomendar a medicina baseada em evidências. Seja gentil e cortês. Seja mais paciente que o seu paciente”, orientou o professor.
Segundo ele, o Congresso da SOCESP é um dos maiores encontros da América do Sul. “Já participei anteriormente e fiquei impressionado com a qualidade dos palestrantes, a generosidade dos organizadores em me fazer sentir em casa e o engajamento do público. A SOCESP é uma oportunidade incrível para discutir ciência e ampliar a rede de contatos”, finalizou Adrian Baranchuck.
O trabalho será apresentado por um de seus pesquisadores no Congresso da SOCESP
A Síndrome do Coração Partido, ou Takotsubo, foi tema de um importante estudo publicado no JACC, do American College of Cardiology, no ano passado, que concluiu que a proporção de homens com a doença aumentou de 10% para 15%, embora ela continue sendo significativamente mais comum entre as mulheres.
O estudo, conduzido por diversos pesquisadores ao redor do mundo — entre eles o cardiologista intervencionista e consultor no Hospital Universitário de Greifswald, na Alemanha, Davide Di Vece — analisou 3.957 pacientes ao longo de quase 20 anos (entre 2004 e 2021). Di Vece conta que o grupo de pesquisadores estabeleceu o maior banco de dados global sobre a Síndrome de Takotsubo por meio do Registro Internacional. Ele virá especialmente ao Brasil para apresentar e debater o tema no 45º Congresso da SOCESP – Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo, que acontece nos dias 19, 20 e 21 de junho, no Transamerica Expo Center.
“Nesta apresentação, discutirei percepções importantes sobre o diagnóstico diferencial da Síndrome de Takotsubo, que continua sendo um desafio devido à sua semelhança clínica com as síndromes coronarianas agudas. Além disso, apresentarei uma visão geral sobre os desfechos de curto e longo prazo, incluindo as complicações mais frequentes”, adianta o cardiologista.
Para ele, participar pela primeira vez do congresso paulista é uma grande honra. “A SOCESP é uma referência importante na medicina cardiovascular na América Latina, e estou ansioso tanto pelo excelente programa científico quanto pela oportunidade de construir colaborações significativas com colegas brasileiros”, afirmou.
Questionado sobre como incentivar os pacientes a aderirem aos tratamentos e adotarem hábitos mais saudáveis, Davide Di Vece destacou a importância da confiança e da boa comunicação. “Os cardiologistas devem garantir que os pacientes se sintam ouvidos, bem-informados e amparados. A tomada de decisão compartilhada, a empatia e a continuidade do cuidado são elementos fundamentais para manter os pacientes engajados com sua saúde”, finalizou.
Referências: https://www.jacc.org/doi/abs/10.1016/j.jacc.2024.05.076
A Síndrome do Coração Partido, ou de Takotsubo, é uma doença que impacta predominantemente mulheres, 90,5% dos casos. Ela será amplamente debatida no 45º Congresso da SOCESP – Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo, que será realizado nos dias 19, 20 e 21 de junho, no Transamerica Expo Center, em São Paulo.
O médico e pesquisador sênior do Departamento de Medicina Interna B (Cardiologia, Angiologia, Pneumologia e Medicina Interna de Cuidados Intensivos) da Universidade de Greifswald, na Alemanha, Marcello Markus, virá ao Brasil especialmente para participar do evento. Ele irá proferir uma palestra sobre a conexão cérebro-coração na Síndrome de Takotsubo.
Direto da Alemanha, ele explicou que acidente vascular cerebral, convulsões e outras doenças cerebrais agudas podem levar a complicações cardiovasculares, que também podem caminhar para morbidade e mortalidade cardíaca. “Elas são caracterizadas por aumento dos níveis séricos de troponina, alterações eletrocardiográficas, insuficiência cardíaca e arritmias. A conexão cérebro-coração na Síndrome de Takotsubo é um exemplo de complicação cardíaca desencadeada por um acidente vascular cerebral isquêmico”, detalhou o pesquisador.
A melhor forma de evitar-se a Síndrome do Coração Partido é a prevenção e informações claras para a população sobre as doenças cardiovasculares. “Uma parte essencial é o esclarecimento para os pacientes a respeito do diagnóstico, os fatores de risco e protetores envolvidos, a importância de medidas não farmacológicas promotoras de saúde, como não fumar, uma rotina que combine uma dieta saudável e o incentivo à atividade física”, orienta Marcello Markus.
“Em relação ao uso de medicamentos, é muito importante esclarecer quaisquer dúvidas que os pacientes possam ter quanto à necessidade e duração do uso (geralmente crônico), efeitos colaterais e possíveis interações com outros remédios. Por fim, é determinante que os pacientes sejam informados de que o acompanhamento médico regular é essencial para a manutenção da saúde e o tratamento de possíveis complicações”, completou.
Para o pesquisador da Universidade de Greifswald, ao longo dos anos, o Congresso da SOCESP se consolidou como uma referência para atualização e plataforma de cooperação científica entre profissionais médicos e não médicos da área de cardiologia, não só do Brasil, mas de todo o mundo. “Poder colaborar com este evento científico não é apenas uma oportunidade, mas um privilégio”, elogiou Marcello Markus.